terça-feira, 10 de dezembro de 2013

Entretecimento

Não te darei os poemas que fiz
porque me são mui caros
Com dor foram trazidos à luz
E foram tecidos nas minhas entranhas
com o líquido das tuas palavras rarefeitas
São parte de mim, portanto
Mas serão teus enquanto viveres
Serão todos teus
Enquanto viveres em mim

terça-feira, 24 de setembro de 2013

Da chama aos estertores: a senda do peregrino equivocado


Debruçar-te-ás sobre as tumbas
dos gigantes iluminados
cujos antepassados num ímpeto
de vanglória
fundaram a portentosa Babel

Indagar-te-ás por entre as sombras
e responder-te-ão os desencarnados
cujos espíritos, banidos do firmamento,
retorcem-se à penúria
por terem, na origem, subvertido seu papel

Então, alimentar-te-ás do néctar das obras
e do pão malignos, bem paramentados
cuja morte certa será o teu merecimento
ainda que te conforte a luxúria
Trazem para ti os que sobem do abismo com teu mel

Assim que não verás que tombas
E do teu sangue já embriagados
põem-se a rir do teu tormento
e a apagar da Terra a tua memória
Os que te desviaram do eterno Céu

quarta-feira, 3 de julho de 2013

Casca de Dentro


Eu quero a realidade dura
Melhor que ouro de tolo
Ainda que me cubra a paúra
Não quero descobrir que o ovo,
afinal, era o fruto da víbora
Que seja a verdade a forja deste sorriso
que é um riso miocardiano, pungente e espremido
É quase um gemido
Que me venha franca a vida
com todo o seu desenrolar
Com véus já desfiados a desvendar
Subindo lenta as ladeiras
Despencando dos arranha-céus
No adeus e na lágrima que caiu na rua
Na bala que matou a criança faceira
No temporal que varreu a casa
Na veloz informação que chega crua
Na fria lápide da recordação
Na tua mão que não chegou
a tempo de encontrar a minha

M. Cristiane Cases

segunda-feira, 29 de abril de 2013

Assim falava Zaratustra... E daí?


Como é confortável ao espírito humano atribuir a outrem palavras duras, indigestas. Assim falava o fulano de tal... Mas, por trás da pena, o dono da mão é quem fala. Ficar refém do que se diz é um preço impagável certas vezes. Sujeitar-se a receber um rótulo por trás do qual virá a ocupar um lugar de destaque no rol da fama ou conhecerá os ermos áridos do ostracismo é, antes de tudo, um ato de coragem de quem se propõe a escrever.  É nesse contexto que me manifesto. Em primeira pessoa. Falo, escrevo e vivo isso!
Vive-se na Era da Informação... Ou seria do Conhecimento? Tenho dito que informação não é conhecimento. A Era do Conhecimento nós, enquanto Humanidade, a temos vivido desde que estendendo a mão, livre de grilhões ou cadeias, o homem tomou do seu fruto e alimentou-se dele – do Conhecimento. O preço dessa escolha foi empreender uma busca compulsiva, por mais e mais conhecimento. Ora, o fruto estava lá no princípio e foi apenas colhido por alguém que não o plantou naquele lugar. E, crescia à sombra da outra árvore, no centro do Jardim, cujo fruto era (e ainda é) a Vida. Acaso, a boa mão que o tenha plantado justamente ali - e cuidado para que se tornasse agradável aos olhos, como também o deveria ser o fruto da árvore vizinha - não saberia igualmente apontar um caminho para o conhecimento que não lançasse o homem em regiões abissais das quais não se livraria mais? A resposta é sim. Como sei disso? Porque refiz o caminho e comi do outro fruto. Mas o homem, lá no Jardim, não resistiu à tentação de se ver autossuficiente. Ser onipotente, onisciente – o que mais poderia o homem querer para si? Talvez, nesse intervalo de tempo, o vento tenha agitado com doçura os ramos da outra árvore, levando seus frutos ao alcance da mão do homem como um convite à Eternidade, ao Amor, à Liberdade e à Paz. Mas, seu coração, por inteiro, já havia sido tomado de assalto. Então, procurou o homem, por seus próprios meios, ser igual ao Criador do Jardim, o dono de todo o Conhecimento – já não lhe bastava mais a mera semelhança com este. Triste sina!
Daqui a algumas gerações perguntar-se-ão os jovens filósofos: quem é Platão, Sócrates ou Aristóteles diante do nosso Conhecimento? Quem é Nietzsche ou Edgar Morin à luz do nosso pensamento? Descartes e seu reducionismo, então, serão uma piada! Porque, de tanto desconstruir-se e reerguer-se sobre seus antigos fundamentos, a Filosofia e toda a Sociologia ter-se-ão dissolvido num denso lamaçal. E a profecia, enfim, se cumprirá.
Eu, por minha vez, enquanto leitora, prefiro Almitra a Zaratustra, cujo discurso parece interminável. Note-se que me refiro a Gibran e a Nietzsche. E que venham os críticos de plantão, pois que estou como quem compara melancias com romãs! Que me importa! Quero falar de fontes. Fontes de onde provém o Conhecimento. Então, que venham Gibran e Nietzsche com seus profetas! Posto isto, vamos às fontes. Porquanto não é recomendável nem sensato dissociar de seus escritos a pessoa do autor. De fato, pode ser um o que se apresenta no papel e outro o dono da mão que lhe dá a voz, mas convém que o leitor procure a procedência das palavras, a fonte. Porque o escrever se torna tarefa demasiadamente fácil quando não se tem a intenção de comprometer-se com o que se coloca no papel. Principalmente quando se trata de Profetas! Fácil é dizer: “façam o que eu digo!”. Azedume ou doçura, um e outro lançado no papel, silencia diante do que o viver propaga a plenos pulmões. O que há na fonte de águas amargas - será veneno? E de onde jorra tanta água doce- estaria incontaminada? A água boa para o consumo humano necessita ser insípida – nem amarga, nem doce. Sobre qual fonte o leitor desavisado estaria se debruçando?


Há uma fonte que jorra para eternidade. Quem se aproxima desta fonte, logo vê a inscrição: “Se alguém tem sede, venha a mim, e beba”. Tive o privilégio de conhecer esta fonte e beber dela. É água medicinal. E eu não fui a única a conhecer: também Nietzsche e Gibran beberam da mesma fonte.  A questão é: até que ponto eles se deixaram preencher do Conhecimento da Verdade, vertente desta fonte? E o mistério inescrutável ao homem reside no fato de que a fonte é também a árvore e a água é também o fruto. Do que experimentei, posso apenas falar por mim, que é o que me convém: sempre que recorro a essas águas, mais dotada de clarividência se torna a minha existência, pois o fruto que me é muitíssimo agradável aos olhos, também sacia a minha sede. O materialista, ao ler isto, perguntar-se-á: de que me serve a clarividência? Às favas com a clarividência, então, materialistas! Deixai-a para aqueles de que dela necessitam e a empregam para alcançar a paz de espírito, compartilhando esta dádiva com outros, pois a fonte é inesgotável e está ao alcance de todos.
Sede por Conhecimento? Vá até a Fonte! Simples assim. O leitor talvez ainda tropece no manto do sábio Almitra que vai errante pelo caminho. Mas Zaratustra, este morreu desidratado. Coitado.

Autoria: Mirna Cristiane Cases

Notas:

A inscrição “Se alguém tem sede, venha a mim, e beba” encontra-se na Bíblia, em João 7:37, declarada por Jesus, o Cristo.